Thursday, March 28, 2013

Intelligence ao Serviço da Economia: Descoberta Portuguesa da Globalização

Como prometido aqui fica o primeiro de vários posts de perspectiva histórica sobre a utilização da intelligence ao serviço da economia. E começo, claro, por destacar um notável feito português.

No período das Descobertas, as informações comerciais e tecnológicas, assumem um papel fundamental no jogo de poder entre nações. Desde o século XIII, Florença assume um papel central como centro de estudos geográficos e graças aos mercadores italianos, em grande número na Península Ibérica, as informações não cessam de circular nos dois sentidos:

“Os Florentino estão entre os primeiros informados sobre a progressão obstinada dos Portugueses ao longo das costas africanas e a sua curiosidade marca tanto um interesse científico como uma real apreensão ligada à descoberta de novas vias que correm o risco de enfraquecer o seu próprio comércio” (Claude Mathon)

A intelligence  está bem presente na construção da hegemonia  portuguesa do sistema mundial, como bem explicam Jorge Nascimento  Rodrigues e Tessaleno Devezas na obra “Portugal – O  Pioneiro da
Globalização”.

No período em que Portugal se consolidou como potência hegemónica assistiu-se a um verdadeiro “processo evolutivo de aprendizagem sistémica”, com a construção de um sistema de alcance global (criação de uma rede global e de instrumentos de projecção global) e com a emergência de algum comprometimento científico.

Os autores referem ainda que “apesar das fortes raízes empíricas da Expansão Portuguesa, do seu incrementalismo pragmático e do seu forte improviso, os líderes de Quatrocentos e Quinhentos concretizaram uma estratégia de gestão do conhecimento”. Esta estratégia “permitiu a afirmação de um espólio único de capital intelectual do país na cena mundial: um primeiro  think tank  virado para a Expansão sistemática, uma vaga de publicações científicas originais, uma revolução na cartografia e na ciência da construção naval”.

No quadro favorável do recuo da China na expansão oceânica, da incapacidade das Repúblicas Italianas irem além do Mediterrâneo e da fraca potência naval daqueles que dominavam as rotas de mercadorias vindas de África, do Médio e Próximo Oriente e do Índico, Portugal, em particular os irmãos infantes D. Henrique e D. Pedro e o rei João II, soube encetar uma estratégia de expansão alavancada, entre outros componentes, no uso da espionagem e da intelligence, bem como de práticas de influência (soft   power), nomeadamente, junto do Papa, aliadas a uma forte presença e acção militar.

Nascimento Rodrigues e Devezas referem a “manha geoestratégica” de João II, como um dos dez ingredientes da diferença portuguesa”. João II é “o Príncipe do Renascimento mais exímio na arte do sigilo  e da desinformação [nomeadamente, sobre novos caminhos marítimos e terras descobertas], da espionagem geoestratégica e da busca de intelligence”.

Podemos afirmar que João II e também Manuel I faziam uma real gestão da informação assimétrica.

A procura do inexistente “Preste João”, poderoso líder católico, alegadamente sedeado em África, que ajudaria os portugueses a derrubar os muçulmanos e ganhar em definitivo o apoio incondicional de Roma, levou ao encontro do caminho marítimo para a Índia e da hegemonia global.

Infante D. Henrique, o Navegador, (1394-1460) reunia em Sagres, perto do cabo de São Vicente, um grupo de cientistas, um verdadeiro think tank (é no entanto questionada por alguns   historiadores   a   existência   física   da   “Escola   de   Sagres”).   Nesta   reunião   de marinheiros, viajantes e eruditos, judeus, árabes e etíopes são preparadas, de uma forma metódica, as viagens portuguesas para os arquipélagos e ao largo de África.

O mapa assume nesta altura funções múltiplas e relevantes. Serve para registar as descobertas e é um verdadeiro instrumento político, diplomático e militar.

Aquela que é considerada pelo historiador Alfredo Pinheiro Marques como “a mais importante carta da cartografia portuguesa e mundial” e “o primeiro planisfério moderno da história da cartografia”, o
Mapa de Cantino, executado em Lisboa, em 1502, pelo italiano Alberto Cantino, é um caso
da história da espionagem mundial.... de que falarei no próximo post.

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