Esta imagem criada e apercebida de Jorge Coelho concedeu-lhe um estatuto em Portugal que não esmorece nem se apaga com um virar de página. Pelo contrário, serve de contexto à leitura da nova página, uma leitura que pode ser distorcida, é verdade, mas que é legitimada pelas páginas anteriores... a não ser que o autor consiga assinalar e fazer passar de um modo claro e evidente uma ideia de ruptura. Até por que não é difícil esclarecer que há modos mais discretos de conseguir favores com a "contratação" de alguém e que se fosse essa, de facto, a intenção da Mota Engil, certamente não tornavam Jorge Coelho CEO, antes o contratavam como consultor, sem sequer terem que o publicitar.
No entanto, não passou a ideia de ruptura. E na opinião pública estranha-se que um político profissional assuma um cargo de executivo de topo numa construtora, "ainda para mais nesta altura de grandes obras", dizem. Para os comuns, esta nomeação tem que ver com o peso político de Jorge Coelho, o único que os comuns lhe conhecem e reconhecem, e com os "favores" que poderá conseguir para a construtora.
Ora, este entendimento dos comuns cidadãos deste país tem por base apenas a informação a que têm acesso pelos media e a imagem pessoal ou a que colectivamente se faz de Jorge Coelho. Com base apenas nesta imagem e face às informações disponíveis é legítimo que as pessoas tracem cenários de "interesses", "favores", que, mesmo que não aconteçam, vão "existir".
Doravante, sempre que a Mota Engil ganhar um concurso público ficará a ideia do demérito do grupo e do CEO Jorge Coelho e o mérito do político Jorge Coelho... e esta ideia fica porque não foram dados aos comuns outros elementos de informação que contribuissem para assinalar uma ruptura e/ou justificar uma escolha.
A Mota Engil e o seu novo CEO não souberam gerir a informação, não soberam agir sobre o tabuleiro informacional onde hoje se joga a vida pública de personalidades e empresas para gerarem as condições favoráveis a esta nomeação. À Mota Engil cabia a necessária, como evidencia o actual clima de suspeição e, em alguns casos, de histerismo, justificação da escolha, do mesmo modo que Jorge Coelho mais teria a ganhar que a perder de falar sobre o assunto, não para se justificar, porque quem precisa de o fazer é quem o nomeia, mas para deixar clara uma ruptura com imagem que dele faziam e ainda fazem.
Este é um caso evidente de falta de gestão estratégica da informação, de falta de Inteligência Competitiva, que fragiliza a imagem de um grupo e de um responsável.
Se, de facto, não está em causa qualquer ilegalidade ou imoralidade, porque não soube a Mota Engil preparar convenientemente esta nomeação? Porque não agiu preventivamente para afastar cenários ou teorias da conspiração, uma consequência previsível do silêncio?
Quando não mobilamos convenientemente uma sala sujeitamo-nos ao eco, mesmo que o que se ouve seja desagradável, ou incorrecto. Havia aqui que saber mobilar o espaço público, preparar a opinião para receber sem teorizações ou especulações a notícia da entrada de Jorge Coelho para a administração do grupo Mota Engil. Havia que traçar os cenários, saber os pontos fracos da nomeação, em termos de imagem, para que a melhor resposta não fosse o silêncio (sempre a melhor resposta dos mal preparados) ou um mero "é assim", como disse Jorge Coelho a José Pacheco Pereira.
PS (post script e não Partido Socialista): Não importam aqui as declarações tão oportunas, quanto ridículas, de algumas personalidades da política nacional, para generalidade da população vistas como um exemplo de dedicação aos superiores interesses de si mesmos. A visão destas personalidades sobre a matéria, enquadrada pelos ainda inexplicados exemplos de passagens da política à acção empresarial, transversais aos vários partidos, é tida em conta pelas generalidade da opinião pública com o desprezo que merece ao povo quem aparentemente (e para esta aparência muito contribuiram os que desgovernaram este país ao longo de décadas, "sempre os mesmos", como comummente se diz), ao invés de servir o povo, tem sabido, com grande grau de competência, servir-se do povo.