A Cavaco Silva dá, de facto, muito jeito mostrar solidariedade com a Geração à Rasca que, coitada, não tem culpa de ter nascido e nem culpa tem de ter como ambição máxima queixar-se muito das agruras da vida e bradar que merece receber um bom salário só por ter estudado.
É uma atitude coerente, nada como nos desculparmos com a falta de sorte, com a maldade e injustiça de outros, para justificarmos a nossa própria incapacidade, falta de empenho e falta de ambição.
As políticas “estruturantes” que Cavaco definiu enquanto PM - e que condicionaram o belo estado em que este país se encontra - também não resultaram por manifesta falta de sorte, já que a ideia de que a melhor estratégia para um país é aproveitar o crédito fácil e os subsídios à inactividade para comprar feito ao invés de fazer era, de facto, a mais prática, do ponto de vista imediato e contabilístico, até porque havia subsídios europeus à farta para pagar o festim português de inaugurações de grandes obras e para pagar para não produzir.
Hoje, quando o crédito aperta, o “milagre económico” de Cavaco, que os seus fieis seguidores sempre reclamaram, revela a sua inconsistência, irresponsabilidade e consequências. E o mais grave é que as decisões então tomadas eram de facto estruturantes, com vários compromissos assumidos por décadas, o que faz com que tenham ainda um impacto significativo na economia actual e, sobretudo, na mentalidade dos portugueses que se habituaram mal a ter acesso fácil e barato aos confortos modernos, de que não querem abdicar, mesmo em tempo de vacas magras e leite muito caro.
Agora, achar que numa Geração à Rasca está a salvação do país é prova de uma extraordinária capacidade para conformar discursos à demagogia que melhor serve uma determinada vontade política.
Salve-se o país de vir a ser desgovernado por uma Geração à Rasca. Eu prefiro olhar para os que, fazendo parte da mesma geração, souberam trabalhar para conquistar um lugar nas suas empresas e provar à geração anterior de que tinham capacidade de iniciativa e vontade de, independentemente do salário, fazer mais e melhor para merecer mais e melhor. Que não se importaram de trabalhar à borla ou com salários mais ou menos simbólicos para provar qualidade e para iniciarem a sua formação profissional e ganharem experiência e real competência para poderem exigir um salário compatível com funções e qualidades.
Eu prefiro olhar para a Geração Desenrascada. E pena é que essa não seja mais valorizada que aquela que está à rasca (excepto quando sai à noite para ir tomar um copo ou quando vai a todos os festivais de Verão) e que, pelo absurdo de algumas ideias que defende, tão cedo não vai sair da casa dos pais.
Acho que neste país há muita gente, em todas as gerações, bem capaz, e que se manifesta todos os dias nos seus locais de trabalho fazendo o máximo para poder exigir o máximo, ao invés de cumprir serviços mínimos por só ter o mínimo. E esse movimento social é o que verdadeiramente merece ser destacado e servir de exemplo.