Tuesday, January 29, 2008

Incentivo à poupança vs. incentivo ao consumo

Discutia-se ontem no programa da RTP "Prós e Contras" a questão dos certificados de aforro e o modo pouco sério como o Governo decidiu baixar a remuneração desses mesmos certificados. Os economistas presentes defenderam, por um lado, a necessidade de o Governo se financiar do modo mais barato possível, um princípio geral que todos defenderam, mas foram suscitadas dúvidas quanto à legitimidade social da medida de abaixamento dos juros.

A questão central passa por perceber se num contexto de alto nível de endividamento de Particulares, Empresas e Estado não se deveria optar por incentivar a poupança de particulares e empresas e encontrar uma solução para o Estado que permita também a este poupar, sem colidir com os interesses de Empresas e Particulares. Ou se, por outro lado, não se deveria optar por estimular o consumo.

O problema está no facto de o Governo não estar a fazer uma coisa nem outra, ou seja, centrou-se apenas no seu problema - com desinvestimento público, manutenção da carga fiscal pesada e desincentivos à poupança (sem poder incentivar o consumo porque as famílias e empresas estão endividadas) - e esqueceu-se que Particulares e Empresas fazem parte da solução.

Ao contrário do que muitos dizem, o Governo não está obcecado pelo défice, está, isso sim, obcecado pelo corte das despesas e pela adopção da medida mais fácil do ponto de vista da receita - a inércia, com a manutenção de uma carga fiscal e um sistema burocrático pesadíssimos que impedem o investimento de particulares e empresas, por falta de liquidez.

Também ao contrário do que muito levianamente se tem dito e escrito, não se está a reduzir o défice das contas públicas. O que se faz e prevê continuar a fazer é reduzir a taxa anual de crescimento do défice consolidado, já a tocar os 65%. Uma redução real do défice implicaria que todos os anos tivéssemos superavit orçamental, o que não sucede, nem por sombras, e, pior, parece que aos lideres cá do burgo satisfaz muito bem ter um défice orçamental de apenas 3% do PIB.

Ora a percentagem 3% é, como todos sabemos, um valor relativo... ao PIB, à riqueza produzida no nosso país, logo, se aumentarmos o PIB e se mantiverem os valores absolutos do défice orçamental reduzimos automaticamente a percentagem do défice. E tão ou mais complicada que a falta de capacidade dos sucessivos governos para a gestão corrente das contas públicas é a incapacidade do país produzir riqueza - é aqui, a par de vários problemas estruturais da nossa economia, que reside a solução e o problema.

O Estado pode tornar-se mais ligeiro, é verdade, mas isso só poderá acontecer sem graves consequências sociais se forem primeiro criadas as condições de mercado para absorver a mão de obra em excesso no aparelho de Estado.

Não existem, obviamente, milagres económicos, existe sim estratégia e é precisamente isso que tem faltado a Portugal.

Estimular a economia tem de passar forçosamente por estímulos ao investimento, à competitividade, com desagravamento de impostos para empresas e particulares. Claro que no curto prazo isto terá impactos negativos nas contas públicas, mas no médio/longo prazo, se bem gerido, os impactos serão positivos. O mercado terá condições para absorver mais mão-de-obra e o estado poderá tornar-se mais ligeiro, cortando na despesa corrente e com ganhos na receita, em virtude do crescimento económico.

Havendo liquidez poderemos aí começar a poupar, a reduzir o défice orçamental, mas neste momento - e basta olhar para os lados (Espanha e EUA) - importa estimular o consumo, dando aos portugueses o que à grande maioria falta - dinheiro e pedagogia, para que entendam que as viagens ao Brasil e a outros países onde os portugueses se gostam de sentir ricos não são uma necessidade, são um luxo.

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